terça-feira, 9 de dezembro de 2008

Pranto notívago

Improvável desnudar o querer
Árduo é o não querer,
Contudo.
Mata-me não saber onde ir
Morro aos poucos por ficar
Não mudo.

domingo, 13 de julho de 2008

Desconexo

Calos de andarilho lunático

Calam-me os passos gastos

Falam nos telhados os gatos

O esperanto da espera apática

Miado entre equador e ártico.

Me recato, em nada enfático.

domingo, 6 de julho de 2008

Não pertenço a R

Entendo de gente,

de assuntos esotéricos

à sentimentos dramáticos,

para tudo o que se sente

dou conselhos fantásticos.


Para equações numéricas

sou um demente lunático,

protótipo de incógnita

elevado ao neurótico

perdido na matemática.

Amáveis indomáveis

Não chegues tão perto!

Mora uma ave de rapina,

Uma ave ferida,

No oco deste tronco branco.


No cerne do deserto,

Suas inertes retinas

Refletem da partida

Pegadas de um santo manco.


Tal destino incerto,

Qual paralela sina:

Cravelha de duas vidas

Em negras plumas, e negro manto.

terça-feira, 24 de junho de 2008

Silêncio

Casa frágil da ilusão

Uma caixa de vidro

Oportuna se é abrigo

Sufocante se é prisão.

Tocador de viola

Em versos cantados, enfeita de amoras

Os ramos tristes da vida mundana

Provoca o riso das velhas senhoras

Corteja as belas ciganas

Partilha provérbios insanos

Decifra os arcanos humanos

E adorna o caminho das horas.

Vendedor de ilusões

Vende-se um teto:

Pode ser de palha

Também de concreto

Tem sombra de dia

À noite têm estrelas

Se chove é coberto.

Tem forma de pipa

Tem cor de maçã

Nem curvo, nem reto

Um teto poesia

Moldado nas mãos

De um anjo arquiteto.

segunda-feira, 23 de junho de 2008

Sonhador

Se o meu coração fosse de barro

Não seria alvenaria

Também não seria jarro

Porque nada aprisionaria.

Se de espuma fosse o meu coração

Não estaria em banheira de luxo

E sim nas ondas do mar

Brincando longe da razão.

Se meu coração fosse de pó

Sujeira não iria causar

Estaria no espaço imenso

Seria poeira estrelar.

Se meu coração fosse de gelo

Não seria indiferente

Nevaria nas montanhas

Até virar água corrente.

Se fosse de metal o meu coração

Não seria gaiola, nem espada

Seria a mais linda jóia

Da indiana adornada.

Se o meu coração fosse de pedra

Não seria um diamante

Seria um seixo de rio

Onde se banham os amantes.

Se dentro do meu peito

Batesse um coração de vento

Seria fresco no dia quente

E adormeceria no relento.

Mas meu coração é de carne

É só um coração de gente

Que queria ser tanta coisa

Por isso bate incoerente...

Bicho

Sou bicho livre que não gosta de sapato

Bom é o som do mato e o cheiro do mar.

Um bicho solto e inconseqüente

Que ama bicho e ama gente

Bicho grilo, rã e passarinho

Encolhido no ninho, tem vontade de voar

Bicho tranquilo, que vai deixar de herança

O prazer de ser criança e o gosto por sonhar.

Transformação

Destroem a chuva e o vento

As humanices pendidas no tempo

Como se brincassem com a vida

Transformam o reto em orgânico

Inventando um jardim botânico

Em cima da casa esquecida...

Ponto de vista

Tudo o que existe

É o que cada um identifica,

É o que passa e fica

Prosperidade ou agonia.

A mesma cena, o mesmo dia

Faz do espectador um criador

Da paisagem rica ou vazia.

Tudo que existe é o que se acredita

Vidas, sonhos, deuses e poesias.

Libido

Este pranto esconso entre as pernas

É néctar de planta mordida

Da mulher que transborda de vida

Fonte etílica e terna de sanha uterina

A flor que abre tardia

Com alguma metade divina

E outra de fêmea vadia.

terça-feira, 4 de março de 2008

Nem pedra nem pássaro

Entre estes mundos estranhos

De pedras estáticas e pássaros,

O corpo move-se com passos

Imprecisos e imprensados.

Além de víceras, sangue e tutano,

Atem o amor, os medos e enganos,

E Cerra com a pele

O frágil humano.

Utilidades do sovaco

O sovaco parece ser

uma parte um tanto inútil...

Mas o que seria do crente,

ou do intelectual,

sem o porta-livros pessoal?

Uma observação factual

demonstra como ele é útil

apesar de cheirar mal.

segunda-feira, 11 de fevereiro de 2008

Amor de retirante


Permita-me pensar em ti

Porque sem ti há um vazio

Como na roça o bem-te-vi

Voa triste em tempos de estio.


Permita-me saber de ti

Ao menos se passas bem

Mesmo tão longe de mim

Sempre serás meu bem.


Quando na roça chover

Daqueles pingos graúdos

Que fazem brotar os miúdos

E Eu voltar para te ver


Talvez possas me permitir

Não só pensar ou saber

Mas também ajudar-te a colher

E ao teu lado ver a noite cair.